segunda-feira, 21 de março de 2016

Carta Para o Amanhã

   Não que essa fosse a maior novidade no mundo. Mas não se pode deixar de saber que estar dentro do contexto muda completamente a situação. Então ela se torna uma novidade, não das melhores.
   Um tropeço, uma caída, um dia ruim. Semanas ruins, meses péssimos, poços sem fundo. Assim sucessivamente até que a vida seja um suplício.

"Bobeira se matar, né? Coisa de gente idiota." - Solta quem diz que entende sobre a doença.

   Não dá pra culpar. Eu também achava que entendia.

"Para de frescura, isso é preguiça."
"Você tem que tentar mais."
"Para de chorar."

   E diferente de uma infecção urinária, um desvio na lombar ou um braço quebrado, dificilmente descobre-se o porquê dessa doença ter surgido. Logo, ainda que existam tarjas pretas e vermelhas ou calmantes fitoterápicos, não se faz aí a cura certa e rápida. Talvez nem a cura se faça. É, tem-se a sensação. E que péssima sensação.
   Sensação onde pede-se que seja o último suspiro, ou uma triste ilusão. Porque na realidade mesmo uma ajuda passa a ser questionável, numa mente não muito sã.

  Não precisamos só de ajuda, precisamos de um milagre.

É uma doença do espírito, afinal.
Busca-se Deus, igreja, pais e amigos e miseravelmente vendo todos os esforços parecerem i m p o t e n t e s.
Você impotente.
Inválido.
Falhando miseravelmente ao atualizar a matéria, fazer um café, levantar da cama que seja.
   Ora otimista e, em todas as outras, súbtamente vivendo a agonia que é estar preso dentro de si mesmo. Sem encontrar razão ou causa.
Incapaz de sentir inveja, raiva extrema, alegria saltitante, prazer.
   A cabeça se esvai e se livra de toda a atenção. Em qualquer coisa. Provavelmente tentando de forma automática e desesperada encontrar o motivo pra se existir - "que loucura!" você deve estar pensando.
   Bloqueio criativo, bloqueio social, ora dormindo horas a fio e forçando o sono pra não acordar, ora encarando a insônia como mais um episódio.
   Sem aproveitamento de pensamento, como se uma bola de feno passasse em uma rua vazia levada pelo vento como nos filmes de faroeste. Sem planejamentos, expectativas, sem porquês e sem respostas. Apenas uma absurda agonia que parece interminável.
   E se Hugo Cabret dizia que até as máquinas tem seu propósito e que elas quebradas causavam tristeza por não servirem a esses propósitos, ele também dizia que isso acontecia igualmente com as pessoas. E perder nosso propósito era como estar quebrado.
  Estou quebrada.
  Aguardando quebrada por mais um amanhã. E apenas isso.

Nenhum comentário:

Postar um comentário